27 de agosto de 2010

A TERCEIRA E OS CASTELHANOS

Revista dos Centenários
Dezembro de 1940

A BATALHA DA SALGA II
Por Vitorino Nemésio


Estavam de volta a Angra em Outubro, cobertos de mercês. O povo que é festeiro, apinhava-se no cais e na Prainha. Fr. Melchior subiu ao púlpito da Misericórdia e, cheio do prestígio dos abraços reais e das águas salgadas corridas na caravela do Chichorro, conven­ceu meio mundo da próxima vitória do Prior, das vilas e castelos que se levantariam por êle. Como o frade era eloqüente e engraçado, o poviléu entusiasmou-se e levou-o de charola ao convento.
Mas êste entusiasmo não era geral nem côr de rosa. Os Jesuítas predispunham parte da nobreza a aceitar Filipe II. O Colégio dêles era muito frequentado: a igreja enchia-se. Moravam no coração da cidade, a dois passos da Câmara. Quando apareceram doze galeões em frente de Angra, com Diogo Dias, que Vinha palpar terreno para aclamar o espanhol, o povo levantou-se, obrigou o emissário a embarcar só a governança da ilha, já de si re­ceosa e minada pelos padres, respondera evasivamente. Os mais afoitos, Pedro de Castro do Canto e os Ferreiras de MeIo, pai e filho, fretaram navio para Lisboa, como o comerciante ilhéu de agora, que não se fia no telégrafo e tira mas é passagem no, CARVALHO ARAÚJO, para ver com os seus olhos. Mas, ao entrarem a barra, D. António estava batido, a gente do Du­que de AIba prendeu-os e tomou-lhes os criados, os escravos, os cavalos que traziam para luta.
Estas dedicações não se perdiam de todo. Ciprião de Figueiredo tirava delas o rendimento que não escapa ao bom chefe: argumentos de tenacidade, diversões dos pontos mais fracos da fidelidade popular para noticias que levantassem a moral.
Mas o poder do boato não era para desprezar. Sabia-se já na ilha que havia côrtes marcadas por Filipe II para Tomar em Abril seguinte. Os jesuítas exploravam hàbilmente com o poderio do castelhano, com a anunciada sujeição das Indias a armada de desembar­que que não tardaria a velejar. Havia já entre os fidalgos mais chegadas ao Colégio uma con­jura em forma quando, a 29 de Setembro, aparecendo o bordo de uma nau à vista de An­gra, João de Betancór, um dos do partido de Castela, tomou a nuvem por Juno e, a cavalo, de lança em punho.. correu as ruas da cidade aos vivas a Filipe lI. Mas a nau era bem por­tuguesa e vinha da India. O povo. picou-se com a filáucia do fidalgo e, cama êle se escon­desse numa casa da rua Direita, meteram a machado a porta dentro. Se não fôsse o alcaide­-mor da cidade, que o levou ao corregedor, davam cabo dêle ali mesmo.
continua
MM

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