26 de agosto de 2010

A TERCEIRA E OS CASTELHANOS

Descoberta acidental. Este texto de Vitorino Nemésio, dá gozo ler, dada a sua peculiar forma de contar coisas. 

Revista dos Centenários
Dezembro de 1940

A BATALHA DA SALGA I
Por Vitorino Nemésio
A Restauração nos Açores, um pouco tardia, explica-se pela facilidade de condições de resistência a Filipe Il. O ilhéu tem fama de teimoso. E não só por isso. As causas da fra¬queza do Prior do Crato em Alcântara e da debandada final não serviam para os seus poucos mas duros fiéis das ilhas. Ficavam Ionge; tinham o mar entre êles e as tropas do Duque de Alba. Além disso, quem estava à frente do movimento na Terceira, ilha de que tudo dependia, era um capitão autêntico apesar de corregedor, em suma um homem, a quem os historiadores gerais não dão o lugar que merece nas tentativas feitas pelo Portu¬gal saído do Mestre de Avis para não morrer. Chamava-se Ciprião de Figueiredo.Em Julho de 1580 o Prior mandara aos Açores uma pessoa de confiança, um tal António da Costa, encarregado de converter os mais grados da terra à causa. Levava a levava a nova da morte do Cardial, uma carta da Câmara de Lisboa; e em Angra «arrastaram bandeiras» pelo rei estéril. Mas, na vila da Praia; que ainda conservava uma boa parte da nobreza e fortuna da Terceira. das pessoas presentes à aclamação raras assinaram o auto, receando (diz Drummond)j que aquelas coisas não tivessem «efeito durável e próspero»...Outra virtude do ilhéu, além da teimosia, é a prudência. António da Costa. cum¬prido ali o recado, passou ao Faial e morreu. Mas na Terceira, apesar da nega a firmarem de cruz um auto que bem podia ser um passaporte para a fôrca, ficavam sementes de patrio¬tismo e de resistência. Ficava sobretudo o corregedor, que tinha alçada nas ilhas todas e sabia puxar por ela.Parte da nobreza e o que Drummond chama «o povo miúdo em geral» estavam sinceramente com o último rebento de Avis. Aos mais esclarecidos, como Pedro de Castro do Canto, Provedor-Mor das Armadas, o nome do Infante D. Luiz, pai do pretendente, lembraria o de D. Manuel, e êste o poder de frotas que, na ida e volta da India, refrescavam na ilha. De torna-viagem, Vasco da Gama lá deixara sepulto o irmão Paulo. E todos os navios, levando para as novas descobertas os rapazes e os frutos da terra, deixavam em troco dinheiro e esperanças.Entretanto chegava à ilha a nova da derrota de Alcântara. Para impedir que a con¬fusão e o derrotismo lavrassem enviaram-se emissários a Lisboa, entre êles um franciscano afamado, prègador popular, Fr. Melchior. A caravela, de um armador da terra, o Chichorro, levou-os a Aveiro no princípio de Agosto. D. António estava meio escondido, ainda ensan­güentado da refrega, e recebeu bem os ilhéus. Lá lhe disseram com que fazendas e vidas poderia contar. O bastardo acenou-lhes com o socorro da França, apertou-lhes os ossos e par­tiram.
continua
MM

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